sábado, outubro 28, 2006

DELÍRIO


Mosquitos lilazes povoam as laranjas de pomares desertos.
O Sol volta a meio invés o seu destino, levantando-se ao meio-dia e assim confundindo as capoeiras e os altos das igrejas.
Telhados de vidro povoam as cabeças humanas, o que dizer das almas.
Carteiros entregam envelopes de folhas de palmeira com tabaco à vista.
Os vinhos azedados substituem o vinagre às mesas.
As salsichas ganham sua guerra secular com as alheiras.
Bifanas são agora servidas com chantily da Indonésia.
As lages do palácio do governo passam a ser de relva, por exigência do Pinto da Costa.
O Douro é invadido pelo mar com tanta força que passa a correr ao contrário, levando tripas até Espanha.
Os Jerónimos são habitados por toureiros na reforma.
O Tejo torna-se numa banheira de sereios de peito peludísssimo lavando-se com óleo de palma.
As sereias do Tamisa chamam pelo continente como cães uivando em noite de trovoada.
A pirâmide do Louvre vira-se ao contrário para receber as chuvas em vez de chamar por elas.
As pontes de Florença enchem-se de ciganos apregoando os têxteis da China.
Os salgueiros cobrem de frio manadas de gatos fumegantes de vadiagem.
Os emigrantes de Leste manifestam-se pela primeira vez às portas de Alcobaça, com o alto patrocínio da TVI.
As chaimites deixam de novo Santarém, à procura de novos esposos.
O Duque de Trás-os-Montes traz Trás-os-Montes para Lisboa e é finalmente aclamado rei pelos joaquinzinhos.



jaime vehuel

(imagem: www.analogia.org)

terça-feira, outubro 17, 2006

NA SUPERFÍCIE REDONDA LISA



na superfície redonda lisa
dos encantos
correm afinal enormes
prantos
ao som de ventos selvagens
agonias

já no cubo encantado e
bem polido
se elevam outros os
gemidos
de um futuro prenhe
de secreta herança

escolher
entre d.quixote e sancho pança
ou sentir saber
toda a esperança no alçapão
de cada dia


jaime vehuel

(imagem: www.analogia.org)