segunda-feira, dezembro 18, 2006
LIBERDADE
Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D.Sebastião,
Quer ele venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
O mais do que isto
É Jesus Cristo
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...
Fernando Pessoa
domingo, dezembro 03, 2006
VIDRADOS EM NINFA
quinta-feira, novembro 30, 2006
TERCEIRA LAMENTAÇÃO
Injustamente, Senhor, injustamente
a fúria do teu açoite
me corta pela raiz...
Quando amassavas o barro e me geravas
tinhas nas mãos divinas que sujavas
a grandeza da força que me davas
para fazer o que fiz...
Nessa hora do teu parto
a minha fome era a tua...
E os sonhos e os desejos,
sonhados e desejados
nos quatro cantos fechados
da minha noite sem luar nem lua,
eram teus...
Eu ainda não era o Homem,
e tu já eras o Deus...
Era simples e bonito:
mudavas o curso ao rio
antes de o rio nascer;
e depois tinhas um rio
sem este ar de desafio,
sem este aspecto sombrio
que vim a ter...
Tinhas o homem castrado
que a tua doutrina tem...
O macho desnaturado
com a mulher a seu lado
à espera do arranque desejado
que não vem...
Tinhas outro, menos eu,
que não posso andar no céu
de pés colados no chão...
Tinhas outro, que não era
nem a mais humilde fera,
nem a mais falsa quimera
dum meu irmão...
tinhas quem tu quisesses, menos quem
conhece os vícios que tem
mas sabe que saiu de sua Mãe
homem vivo,
para negar a qualquer,
seja Deus, seja mulher,
um simulacro sequer
de amor passivo...
Porque, senhor, onde chego
chega o fogo da fogueira...
Ardo e dou calor à Vida
para me aquecer a Ela...
E chego a ter nos braços a donzela,
só porque a minha paixão é verdadeira!...
E não te peço perdão de ser assim.
Sou tal e qual como vim
de teu celeste jardim
para as selvas brutais da Natureza...
Não tenho culpa de a Obra
cair, por causa da Cobra,
das tuas mãos sem firmeza.
Não tenho culpa de nada!
Tivesses a mão fechada
ou aberta de outra maneira...
O que sou é o que serei,
contra ti ou qualquer lei
que não queira...
Atiro o salto mortal
e concentro a força toda
no assombro da multidão...
E morto ou vivo apareço
dono de quanto mereço,
e a valer o justo preço
que me dão...
Conquisto a Vida e o Pão de cada dia!
Bebo Sol quando há Sol, e noite quando há noite,
e grito quando a voz do teu açoite
fende o meu corpo em dois e o deixa inteiro.
E quando junto do muro me ajoelho,
quebra-me as pernas o costume velho
de te sonhar às vezes justiceiro...
Miguel Torga, in O outro Livro de Job
ver também O Livro de Job em www.religa.blogspot.com, arquivo dez 2006
terça-feira, novembro 28, 2006
CANHÕES DE BRONZE
canhões de bronze abalam um pouco a calma dos peixes voadores
desertos de tremideiras mostram-se como queijo das ilhas em vermelho
alarves varejeiras povoam de azul e verde os enxames de trigo
varinas soltam pregões como águias em pranto sustenido
brutamontes carregam feixes de palha improvável mas candente
velas de mel consomem seus pavios como os bacalhaus devoram golfinhos
jaime vehuel
dez2007
desertos de tremideiras mostram-se como queijo das ilhas em vermelho
alarves varejeiras povoam de azul e verde os enxames de trigo
varinas soltam pregões como águias em pranto sustenido
brutamontes carregam feixes de palha improvável mas candente
velas de mel consomem seus pavios como os bacalhaus devoram golfinhos
jaime vehuel
dez2007
quarta-feira, novembro 15, 2006
PÉTALAS AZUIS
pétalas azuis sobre tua púbis
arroz salgado no horizonte branco
capelas de musgo na margem do riacho
formigas cinza no vale da madrugada
jaime vehuel
nov2006
arroz salgado no horizonte branco
capelas de musgo na margem do riacho
formigas cinza no vale da madrugada
jaime vehuel
nov2006
terça-feira, novembro 14, 2006
SETE ANOS DE PASTOR
Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por prémio pretendia.
Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel lhe dava Lia.
Vendo o triste pastor que com enganos
lhe fora assim negada a sua pastora,
como se a não tivera merecida;
começa de servir outros sete anos,
dizendo: - Mais servira, se não fora
para tão longo amor tão curta a vida.
Luís Vaz de Camões
imagem: www.analogia.org
sábado, novembro 04, 2006
ANJOS MANTÊM
Os anjos mantêm seus antigos lugares;-
Apenas viram um seixo, e tremulam uma asa.
Sois vós, vossas faces alheadas,
Que não percebeis o vento pleno de esplendor.
Mas (quando a tristeza já não puder ser tanta)
Chorai - e, sobre vossa tão dolorida perda
Brilhará o tráfego da escada de Jacob
Instalada entre os Céus e a Cruz.
Francis Thompson: The Kingdom of God is Within You
quarta-feira, novembro 01, 2006
MAIS DELíRIO
Avestruzes encandeiam sofás-cama de peluche.
Cães de peluche espirram o pólen deixado pelas abelhas.
Abelhas-raínha pedem ao parlamento autorização para terem férias.
As férias de Monsieur Patrick saiem furadas porque o avião implode.
Implosões assaltam os parques, abrindo enormes e verdejantes 18 buracos para o golf.
O golf conquista os camponeses do algarve já que as amendoeiras estão em vias de extinção.
Os extintores do ministério da justiça cobrem de pó branco balanças e vendas.
Venda do Pinheiro é uma terra onde agora se vende eucaliptos ao molho.
Molhos italianos assaltam os hambúrgueres sem que o Tio Sam seja chamado.
À chamada faltam 19 bancários porque o jogo do Sporting teve prolongamento.
Prolonga-se por mais um mês o visto turístico dos bandos de cegonhas em passeio por Trás-os-Montes.
Trás-os-Montes passam para a frente deles para verem melhor o Porto Calem e suas propostas de franchising.
As propostas estão sobre a mesa mas como a mesa só tem 3 pernas elas sentem-se coxas.
A coxia do teatro atrai 60 lebres menstruadas.
As lebres desafiam as tartarugas para uma demolidora desforra
A desforra é o des-forro num casaco de senhora.
A senhora dona Etelvina Ferreira Zêzere mandou arranjar o guarda-chuva ao sapateiro.
Os sapateiros desesperam ao polirem os novos sapatos pontiagudos femininos, seguramente sado-masos.
jaime vehuel
(foto: www.analogia.org)
resumo livre:
avestruzes espirram férias furadas abrindo golf de pó branco ao molho e ao molho 19 bancários em passeio para a frente e para a frente coxas do teatro desforram senhora (n)o sapateiro pontiagudo
sábado, outubro 28, 2006
DELÍRIO
Mosquitos lilazes povoam as laranjas de pomares desertos.
O Sol volta a meio invés o seu destino, levantando-se ao meio-dia e assim confundindo as capoeiras e os altos das igrejas.
Telhados de vidro povoam as cabeças humanas, o que dizer das almas.
Carteiros entregam envelopes de folhas de palmeira com tabaco à vista.
Os vinhos azedados substituem o vinagre às mesas.
As salsichas ganham sua guerra secular com as alheiras.
Bifanas são agora servidas com chantily da Indonésia.
As lages do palácio do governo passam a ser de relva, por exigência do Pinto da Costa.
O Douro é invadido pelo mar com tanta força que passa a correr ao contrário, levando tripas até Espanha.
Os Jerónimos são habitados por toureiros na reforma.
O Tejo torna-se numa banheira de sereios de peito peludísssimo lavando-se com óleo de palma.
As sereias do Tamisa chamam pelo continente como cães uivando em noite de trovoada.
A pirâmide do Louvre vira-se ao contrário para receber as chuvas em vez de chamar por elas.
As pontes de Florença enchem-se de ciganos apregoando os têxteis da China.
Os salgueiros cobrem de frio manadas de gatos fumegantes de vadiagem.
Os emigrantes de Leste manifestam-se pela primeira vez às portas de Alcobaça, com o alto patrocínio da TVI.
As chaimites deixam de novo Santarém, à procura de novos esposos.
O Duque de Trás-os-Montes traz Trás-os-Montes para Lisboa e é finalmente aclamado rei pelos joaquinzinhos.
jaime vehuel
(imagem: www.analogia.org)
terça-feira, outubro 17, 2006
NA SUPERFÍCIE REDONDA LISA
na superfície redonda lisa
dos encantos
correm afinal enormes
prantos
ao som de ventos selvagens
agonias
já no cubo encantado e
bem polido
se elevam outros os
gemidos
de um futuro prenhe
de secreta herança
escolher
entre d.quixote e sancho pança
ou sentir saber
toda a esperança no alçapão
de cada dia
jaime vehuel
(imagem: www.analogia.org)
quarta-feira, setembro 27, 2006
ALDINA DUARTE
(Fado)
17 Nov. 6ªFeira
CULTURGEST
Eu quero a alegria profunda que nos ampara para a frente ou para trás conforme o que houver por fazer ou refazer.
Em pequena sonhei com uma casa grande, depois de crescida, encontrei a casa à minha medida, quando sozinha e, noutras alturas, na companhia dos poucos que muito amo.
A repetição de tudo o que é intrinsecamente verdadeiro torna-se sabedoria e, por isso, amor maior... quero repetir-me em liberdade e convicção, quero a repetição dos silêncios alheios que me cabe cantar, porque essa é a minha função, quero repetir todas as palavras, a música das palavras é o seu sentido quando enviadas e recebidas por alguém, quero um tempo onde a leitura e o pão vivem na mesma casa, as crianças dançam e os amigos se encontram para descobrir músicas e onde, sem preconceitos, todos se juntam na construção dum mundo mais digno para qualquer forma de vida, fazendo e aprendendo o que for necessário.
Volto à Culturgest convidada de Miguel Lobo Antunes, volto a estar numa encenação do Jorge Silva Melo, volto a cantar originais nunca gravados do João Monge, volto a estar com o José Manuel Neto e com o Carlos Proença, volto a cantar só músicas de fados tradicionais com letras criadas para e por mim... e o que está para acontecer e não sei ainda.
Regresso ao amor e à esperança necessária e ao prazer possível neste mundo estranhamente cruel em que estamos a viver. Volto para quem me espera, porque as coisas verdadeiras são para toda a vida e não precisam de justificações!
Aldina Duarte
OS VASKOV NO ACQUA
sexta-feira, setembro 22, 2006
MITIGAR CAMPOS DE ARROZ
mitigar campos de arroz
em chamas
como quem faz
nichos no horizonte indisponível
trazer enfim a fonte do alecrim
aos molhos para dentro
jazer como quem parte do pé da laranjeira e
corre discorre
por fora da direcção do vento
encontrar nesse caminho outro sustento
já diferente do amado pão
uma fome que é mais de asas que de vinha
ai
porque será que o sonho lindo é que é
verdade
todavia o sol que sempre nasce sem vontade
da lua que há em si
quem dera fosse a vida enfim
o que é e
todavia a sombra luminosa
dessa vida tão sem luz que nos parece
estar
já basta de quem dera então
olhemos fundo
faço aqui eu um ai ainda mais profundo
afogo-me nele até se assim ele beija
erga-se bem alto o meu pranto defunto
que o fado é um combate e é sem fundo
e o amor do destino é uma bandeira
jaime vehuel
quinta-feira, junho 15, 2006
segunda-feira, maio 29, 2006
VIDA DO MAR
Quantas tardes, eu vou, sozinho, passear
Ao longo do brumoso e soluçante mar...
E vejo, ao cair do sol nas ondas abrasadas,
Entre as rochas que estão de espuma coroadas,
Tristes habitações de pobres pescadores...
Telhados pra abrigar soluços, ais e dores.
São choupanas onde há postigos e janelas,
Donde a Tristeza vê, ao longe, as brancas velas,
Navios onde vai ao leme a Saudade...
Sopra um vento que traz a viuvez e a orfandade...
Teixeira de Pascoaes (1877-1952)
Ao longo do brumoso e soluçante mar...
E vejo, ao cair do sol nas ondas abrasadas,
Entre as rochas que estão de espuma coroadas,
Tristes habitações de pobres pescadores...
Telhados pra abrigar soluços, ais e dores.
São choupanas onde há postigos e janelas,
Donde a Tristeza vê, ao longe, as brancas velas,
Navios onde vai ao leme a Saudade...
Sopra um vento que traz a viuvez e a orfandade...
Teixeira de Pascoaes (1877-1952)
terça-feira, maio 23, 2006
BORDA D'ÁGUA
Olá de novo, depois de uma greve de um mês em protesto contra a falta de visitas.
Trago-lhe hoje uma reprodução da actualidade segundo o prodigioso almanaque Borda d'Água.
Assim reza para 4ªf/24 Maio (o mês em que os camionistas põem flores Maias nas grelhas para afastar os maus-olhados):
Quarto Crescente.
Dia de Sta Suzana e do nascimento de Ferreira de Castro.
E para o mês de Maio todo:
Lavre à volta das matas (limpas...) para afastar incêndios. Tratar e regar os batatais. Iniciar a transplantação de arroz. semear girassol e soja não transgénico. Enxertar medronheiros, damasqueiros, amendoeiras, cidreiras e laranjeiras; plantar tomate. Na Horta semear no Crescente, em local definitivo, abóboras, agrião, alface, beterraba, bróculos, cenoura, couves, ervilha, espinafre, fava, feijão, melancia, melão, nabo, pepino, pimentos, rabanete, repolho. Colher alcachofras, espargos, ervilha, cebola verde, etc. No Jardim semear cravos, mangericos, trepadeiras e plantas anuais. Colher flores para semente. Animais (no Crescente): castrar gado, tosquiar as ovelhas, procria de cabras e coelhos.
sexta-feira, abril 14, 2006
HOMENAGEM A RISOCORDETEJO
LÁGRIMACORDEDOURO
Ó Porto meu querido pai
Com Graal fazes nação
No Porto p’r’ além da bola
Há um Povo com paixão
De granito me fizeram
Lá na Leça do Balio
De granito são as pedras
Do Porto meu arrepio
Ó meus rabelinhos d’ouro
Cantai a Ribeira afora
Senão cantais rabelinhos
Minha noiva vai-se embora
Paranhos do meu amor
Massarelos minha amada
Fui nascer a Cedofeita
Freguesia e namorada
Ó igreja do Marquês
Senhora da Concepção
Trazei os anjos à terra
Cuidai da minh’oração
Ai gentes da Boavista
O eléctrico a rondar
Dezoito p’ra Matosinhos
Pesca Leixões a nadar
Pontinha de D.Luís
Em terra republicana
Carros em cima e em baixo
Conquistando Gaia a mana
Já vejo o Monte da virgem
Já me parece o Choupal
Meu amor traz-me o teu lenço
Coração cor de sisal
jaime vehuel
(foto: constelação)
terça-feira, abril 11, 2006
AH O CANSAÇO
ah
o cansaço
o quase desalento
a última gota a querer
fugir da frágil
taça de jasmim
o sol depois e
sempre
teimoso ainda e
sempre
e sempre laranja em gomos
em se me vertendo
e outra vez a lua
minguando
e outra vez tão cheia
em espelho
como escapar ao destino
gerindo
lhe cedendo?
jaime vehuel
(foto: Amálgama - Companhia de Dança de Mafra)
quarta-feira, março 22, 2006
DEPOIS DE MULHOLAND DRIVE (II)*
um lobisomem sai
fumegante
do café servido à mesa
homem dos fundos
homem do saco
nevoeiro do receio de medos
ainda insabidos
improváveis factos mas personas certas
tão reais artérias horríveis
de mil inconscientes mal dormidos
éclair de jeans aberto
uma púbis em azul riscado
a mão trota
e já cavalga agora toda louca
rumo ao ligeiro torpor de um prazer
falido
sou eu o lobisomem
de mim própria
sou minha alma olhando o medo
de meus olhos cegos
as placas na lapela sempre em troca
como se eu fosse rouca
e o serviço em cacos
caídas
de um tabuleiro fantasma
como tantos anjos
as chávenas de café concreto
ganham chão
para se reunirem
só depois de se passar pela paixão do lobo
o Capuchinho se avermelha
jaime vehuel
mar.2002
*Mulholand Drive: filme de David Linch
fumegante
do café servido à mesa
homem dos fundos
homem do saco
nevoeiro do receio de medos
ainda insabidos
improváveis factos mas personas certas
tão reais artérias horríveis
de mil inconscientes mal dormidos
éclair de jeans aberto
uma púbis em azul riscado
a mão trota
e já cavalga agora toda louca
rumo ao ligeiro torpor de um prazer
falido
sou eu o lobisomem
de mim própria
sou minha alma olhando o medo
de meus olhos cegos
as placas na lapela sempre em troca
como se eu fosse rouca
e o serviço em cacos
caídas
de um tabuleiro fantasma
como tantos anjos
as chávenas de café concreto
ganham chão
para se reunirem
só depois de se passar pela paixão do lobo
o Capuchinho se avermelha
jaime vehuel
mar.2002
*Mulholand Drive: filme de David Linch
A STAR IS DEAD
Fonte: www.portaldoastronomo.org
Ilustração representando a evolução de uma estrela. Quando a estrela consome todo o seu combustível entra em colapso. Se a estrela tiver massa suficiente o colapso dará origem a um buraco negro; este rapidamente formará jactos; as ondas de choque irão expelir as camadas exteriores. As fulgurações de raios gama são os sinais da morte estelar e do nascimento de um buraco negro. Crédito: Nicolle Rager Fuller / NSF
Ilustração representando a evolução de uma estrela. Quando a estrela consome todo o seu combustível entra em colapso. Se a estrela tiver massa suficiente o colapso dará origem a um buraco negro; este rapidamente formará jactos; as ondas de choque irão expelir as camadas exteriores. As fulgurações de raios gama são os sinais da morte estelar e do nascimento de um buraco negro. Crédito: Nicolle Rager Fuller / NSF
terça-feira, março 14, 2006
DEPOIS DE MULHOLAND DRIVE (I)*
há um sofá cama fechado
por dentro da sala turquesa
plena
de lençóis enxutos
e humidade nas paredes ocas
uma cabeleira loira beija
morena cabeleira lívida
como os vampiros beijam
os fantasmas
são olhos cegos de olhar
os que ali se desencontram
são lábios frementes
de algas consumidas
castanhas frias
às duas da manhã da vida
pântanos
os nossos pântanos de estimação
abridos
corpos escancarados e leitosos
exauridos para mais defecagens de
poli-chinelo
convidando agora ao
conhecimento do inferno
por inteiro
não se chega ao âmago da alma
sem passar pelas contra-curvas
jaime vehuel
mar.2002
*Mulholand Drive: filme de David Linch
por dentro da sala turquesa
plena
de lençóis enxutos
e humidade nas paredes ocas
uma cabeleira loira beija
morena cabeleira lívida
como os vampiros beijam
os fantasmas
são olhos cegos de olhar
os que ali se desencontram
são lábios frementes
de algas consumidas
castanhas frias
às duas da manhã da vida
pântanos
os nossos pântanos de estimação
abridos
corpos escancarados e leitosos
exauridos para mais defecagens de
poli-chinelo
convidando agora ao
conhecimento do inferno
por inteiro
não se chega ao âmago da alma
sem passar pelas contra-curvas
jaime vehuel
mar.2002
*Mulholand Drive: filme de David Linch
terça-feira, março 07, 2006
DIA DA MULHER
Acho que, infelizmente, ainda se justifica um dia anual dedicado a que atentemos na condição da mulher. Em alguns lugares por razões candentes de ausência dos direitos humanos mínimos. Mas mesmo aqui também, sobretudo a nível privado, em numerosos detalhes do quotidiano. Mau grado ter vindo a conhecer nas empresas algumas mulheres que, chegando a postos de poder, se revelam bem mais selvagens que a maioria dos homens. (Será uma vingança?)
Deixo umas pequenas frases que há uns anos escrevi para minha Mãe (e que aliás ainda não cheguei a dar-lhe...):
deste Lua a meu Pai
o Sol em ti crescia
e já maduro
deste ao mundo em mim
teu coração.
jaime vehuel
Foto: Andres Amador, www.analogia.org
sábado, março 04, 2006
AO MESMO TEMPO
Embora a teoria das ondas de luz tivesse sido apresentada um século antes, Einstein introduziu a idéia de que a energia é uma estrutura granular quantificada: se expressa em "pacotes" (quanta) e as próprias ondas são quantificadas. Dito de outro modo, a luz é, ao mesmo tempo, ondas e partículas, o que ainda hoje continua desafiando o senso comum.
Texto completo em:
www.ctjovem.mct.gov.br/index.php?action=/content/view&cod_objeto=20267
Foto:
Andres Amador, Kid and pod
www.analogia.org
sexta-feira, março 03, 2006
QUANDO EU FOR
O que é que eu vou ser quando eu for grande?
Quando eu for grande vou ser pequeno outra vez. Aí é que eu me vou divertir que nem uma avestruz!
Vou ser dono de um grande circo argentino.
Antes de mais nada defino como objectivo apaixonar-me pela trapezista, como o anjo do Wim Wenders - mas sabendo esperar por aquele momento, quiçá fugaz, em que esteja disponível para amar.
Sim, porque no fundo no fundo o que eu desejo é ser trapezista, e talvez ela mo ensine.
Enquanto espero pela trapezista convido os dois palhaços - os dois - e trago-os para um jantar na minha roulotte com chuveiro, na esperança de que eles me ensinem as máscaras de que sinto tanta falta.
Já devidamente mascarado, contrato 7 elefantes, só para fazerem a guarda de honra da arena em movimento: catrapum-catrapum, catrapum-catrapum (um truz-truz-truz em grande no tecto do vizinho de baixo).
Como os leões estão pela hora da morte, limito-me a projectar num lençol branco aquela cena do Quo Vadis no circo romano.
Depois vou à rua das Portas de Sto Antão e convido um daqueles cuspidores de fogo que andam por lá com cães vadios e muitos piercings - para o arrancar das ruas vai ser um tormento.
Cãezinhos amestrados só se for aquele minúsculo que anda pela rua do Ouro ao ombro de um menino que tenho visto a crescer por trás de um acordeão. (O menino, agora com os seus 9 anos, não pede: limita-se a tocar e a expor o cão sossegado com um fundo de garrafa de plástico pendurado na boca. Quando o menino acha que os trocos começam a ficar pesados para o cachorro, pára e recolhe.)
Como a coisa já está meio composta, ponho o que já está a treinar para ver se funciona.
Sim, funciona.
Ponho então um anúncio no Destak, com aquele verde deslavado que agora tem o Espírito Santo (o banco) a dizer: Precisa-se senhora trapezista para circo-modelo em grande ascensão. Oferece-se ambiente familiar, salário compatível, descontos para a segurança social e rede física da melhor qualidade existente nas lojas chinesas da zona da Praça do Chile. Solicita-se carta astral para avaliação prévia de compatibilidades temperamentais (com os elefantes guardas de honra). Entrevistas no próximo domingo ao meio-dia no adro da igreja dos Anjos, seguidas de almoço-convívio na Sopa dos Pobres.
Depois a trapezista escolhe-me, eu apercebo-me, ela ensina-me a sua arte, eu ensino-lhe a minha, vendo-lhe o circo por uma côdea de pão, passo a ser trapezista, se ela quiser acumular a gestão do circo ainda com o trapézio fazemos um pas-de-deux e pronto.
Em qualquer caso, temos um monte de crias e somos felizes para sempre.
jaime vehuel
terça-feira, fevereiro 28, 2006
NOS CORREM AMÍUDE
nos correm amiúde
oh! paixões e prantos
ao som de ventos selvagens
agonias
no cubo encantado e
bem polido
se elevam outros os
gemidos
de um futuro prenhe
de secreta herança
não escolher
entre D.Quixote e Sancho Pança
sim sentir saber
toda a esperança no alçapão
de cada dia
jaime vehuel
02.2002
(Foto: Amálgama - Companhia de Dança de Mafra: espectáculo "Mutações")
quarta-feira, fevereiro 22, 2006
domingo, fevereiro 19, 2006
ROMANCE SONÂMBULO
Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar
y el caballo en la montaña.
Con la sombra en la cintura
ella sueña en su baranda
verde carne, pelo verde.
Bajo la luna gitana,
las cosas la están mirando
y ella no pude mirarlas.
Verde que te quiero verde.
Grandes estrellas de escarcha,
vienen con el pez de sombra
que abre el camino del alba.
(...)
Federico Garcia Lorca
Foto: Andres Amador, www.analogia.org
quarta-feira, fevereiro 15, 2006
ÉS UM TRAPÉZIO INDEPENDENDO
és um trapézio
independendo em desafio ao tempo
como se Cronos não passara de uma breve crónica
de costumes vãos
vejo por sobre ti bátegas
suspensas
nuvens em fiapos esperando
que te afastes de cada momento para
só então
a água desabar em riste
e todavia quando balanças há
um ritmo
um compassar a estrada
mais de ampulheta que de corda
entretecendo as alcachofras
jaime vehuel
2001
(foto: trânsito de Vénus, fonte:
www.solarviews.com/cap/index/index.html)
terça-feira, fevereiro 14, 2006
DE AGOSTINHO E DA LOUCURA
"Faço votos que a loucura me inspire e a razão me exprima".
Assim fala Luís Miguel Cintra no filme Agostinho da Silva: um pensamento vivo, dando voz ao filósofo e poeta.
Foi ontem em sessão comemorativa dos 100 anos do nascimento de Agostinho da Silva, no Fórum Lisboa. De facto o Professor nasceu mesmo a 13 de Fevereiro, no Porto, às 20:30 (para quem queira fazer a carta astral). Embora ele se considerasse da Ponte da Barca (para onde foi viver aos 6 meses) - ele dizia que era ali que escolhera nascer.
Permanece no Fórum uma expo foto-bio-bibliográfica que vale a pena ver e que dispõe de um esclarecedor catálogo.
O filme referido já foi exibido em mais de 100 locais no país e no estrangeiro. Está prevista também a sua exibição em Goa. Por cá também vai reincidir.
E muitas outras interessantes realizações (muitas mais que as que eu imaginaria) vão decorrer ao longo deste ano.
Recomendo que consulte www.agostinhodasilva.pt.
Boa noite.
sábado, fevereiro 11, 2006
ANJOS NA LUA
Voltei finalmente ao Monte da Lua (Sintra), para uma caminhada peregrina - com votos e tudo - até à energia que as pedras guardam dos monges franciscanos Capuchinhos.
Mas era o mei da tarde e eu me encontrava ainda no centro da vila. Vai daí resolvi-me a ir subindo até onde o tempo restante até ao sol-pôr pudesse levar-me.
Não mais que uma meia hora volvida reparo pela primeira vez numa curiosa seta: "Azinhaga do Vale dos Anjos". E claro que (perdida a esperança de chegar hoje aos frades) desviei do alcatrão para o mato que se me apresentava. Bendita a hora.
Foi descer, descer, descer para acabar em Seteais. Ir ver dali a vista e desejar experimentar uma noitinha lá no Tivoli. E depois subir, subir muito - com uma pausa para merendar de assento em pedregulho já marcado aquando da descida e que, talvez por isso, se me afigurou familiar.
Muita pedra ora se impondo ora mansamente a espreitar, muito musgo a lavar a alma e a fazer lamentar que comê-lo se não possa, alguns chilreios, um arvoredo antigo e sábio, muita paz em redor, mil pormenores a merecerem foto.
Um belo território que, se não for dos proclamados anjos, poderia bem convir-lhes (digo eu). E que, por certo, é povoado de traquinas elementais.
Tive pois o que almejava: um reconfortante e retemperador banho de emersão no elemento Terra.
Mas porque raio a minha ancestral preguiça consegue impedir-me de fazer estas curas de corpo & alma mais vezes?
jaime vehuel
(foto: algures na net)
sexta-feira, fevereiro 10, 2006
ABRE-SE O VERÃO EM PLENO INVERNO
abre-se o verão em
pleno inverno
este ano gaivotas em
terra
é poiso tempestuoso
com o sal que nas patas lhes ficou
do mar
alcançai infantes as
infantas
que se querem morrer em
fados mal cumpridos
cumprimentai o vento e
sem lamento
finalmente quais gaivotas
aportai
jaime vehuel
(foto: Andres Amador, www.analogia.org)
BEM VIND@
Boa noite,
Este é um novo blog para conter notas do day-by-day (uma balada), alguma poesia e bastantes fotos, próprias ou aprisionadas à net.
Era para se chamar casablanca (em homenagem ao filme, esse tratado de beleza, ética e força), mas (ditames do destino?) o sistema não aceitou tal designação.
Vá, faça já o seu comentário a este nascimento do meu blog. Está também nas mãos dos seus leitores que eu julgue para mim mesmo se isto foi um parto prematuro. (Para já façamos de conta que foi de 9 meses).
Já agora que falamos de partos atempados, benvinda à Terra a Beatriz, que nasceu ontem mesmo, que foi gerada em Alfama e cujos pais conheço. É futura cliente da loja Formiga.
E a este blog, especialmente para si, benvind@.
Foto: www.digitalstudio.com
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